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COMO LIDAR BEM COM O ISOLAMENTO SOCIAL NA COVID-19
Elementos de Psicologia - COVID-19

"Mais do que a escolaridade, mais do que a experiência, mais do que o treinamento, é o nível de resiliência que determina quem é bem sucedido e quem fracassa." (Dean Becker)

 
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tualmente não existe vacina capaz de erradicar a doença causada pelo coronavírus. Assim, mais uma vez na história, a Medicina precisa recorrer às chamadas “medidas clássicas de saúde pública” para conter uma epidemia. Tais medidas implicam no confinamento da população e isso, inevitavelmente, favorece o aparecimento ou o agravamento de Transtornos Mentais, dependendo da forma como cada indivíduo lide com esse estado de exceção. Baseados nos depoimentos de pacientes que estão atualmente em acompanhamento psicológico, este artigo pretende descrever alguns conflitos psicológicos que vêm sndo observados durante nossos atendimentos psicoterapêuuticos,e tambem procurar sugerir formas de ação, visando eliminar ou, pelo menos, mitigar o sofrimento psicológico das pessoas que passam pela situação de confinamento.

O objetivo principal [das] tais medidas de saúde pública é evitar a propagação de doenças de pessoa para pessoa, separando as pessoas para interromper a transmissão. As ferramentas que temos à mão são isolamento e quarentena, distanciamento social e contenção da comunidade. Atualmente, todas essas ferramentas estão sendo empregadas em uma escala maciça sem precedentes [em toda a Terra] e, em Saúde Pública, a única medida conhecida capaz de minimizar essa pandemia é o Isolamento Social, consiste em distanciar as pessoas que contraíram o vírus – portadores assintomáticos ou não –  das outras pessoas,  com a finalidade de evitar o contágio.”  (WILSER-SMITH, 2020)


Uma vez diagnosticada a presença do coronavírus, o isolamento deverá ser prescrito pelo médico e rigidamente observado pelo doente. É a Quarentena, pois o indivíduo hospedeiro que deve ser retirado do convívio das demais pessoas. Atualmente prescreve-se tanto a quarentena domiciliar nos casos sintomáticos mais brandos – denominados “Fase Verde”.
Para os casos mais graves – “Fase Amarela” - é obrigatória a Quarentena Hospitalar e nos casos que já evoluíram para uma Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e estão na "Fase Vermelha”, é obrigatória a internação na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Um isolamento, qualquer que seja o tipo, trará inevitáveis consequências morais, sociais, psicológicas e econômicas na vida de uma pessoa e também na vida dos seus familiares, amigos, colegas de trabalho, vizinhos e de todas as demais pessoas com quem essa pessoa vinha, até então, se relacionando regularmente – presencialmente ou virtualmente.(GRUPO FORÇA COLABORATIVA COVID-19, 2020)

Imaginemos uma pessoa qualquer, que poderia ser eu ou você. 
Quando o isolamento foi decretado, seja pelo governo, seja pelo médico, essa pessoa levava uma vida “normal”: contava com a companhia da mulher (ou do marido), dos filhos e dos amigos; tinha uma rotina de trabalho formal, informal ou doméstico; quando acabava o açúcar ou o macarrão, dava uma corrida no empório do lado de casa para comprá-lo e, nessa ocasião, aproveitava para trocar duas palavrinhas com o balconista e para dar um beijinho na filhinha do dono que lá estava.

 
Há pouco mais de 15 dias talvez tivesse realizado o sonho de conhecer a cidade natal dos seus pais na China, da Itália ou da Espanha e essa, talvez, tivesse sido a primeira vez que saíra do Brasil.


Tinha pouco tempo para pensar, pois tinha que trabalhar cuidar dos filhos, do cachorro, fazer o curso de atualização do novo software que logo vai ser implantado na empresa, visitar os pais idosos, fazer as compras do mercado, ir ao salão de cabelereiro e fazer o curso on-line que o trabalho já estava cobrando tanto quanto os amigos virtuais que reclamavam, pois ela não havia “curtido ‘aquele’ post”.


Essa mesma rotina a impedia de refletir sobre as coisas que estava fazendo: fazia “por que era necessário fazer” ou impelida pela competitividade do mercado, pois “sempre havia outro pronto para ocupar meu posto de trabalho”. Aliás, demonstrar insegurança, dúvida ou indecisão poderia ser interpretado como uma fraqueza e colocar em risco a promoção que tanto desejava.


Sem que percebesse, limitara seu crescimento psicoemocional e empobrecera as relações interpessoais; agora tem um repertório pobre e limitante para lidar como uma situação tão repetina quanto inédita.


Estava preparada para a competitividade diária, para os choques de obrigações, para lidar com pedidos absurdos dos seus superiores, com a falta de tempo com os maus-humores da mulher (ou do marido), com os pedidos dos filhos, com a inveja dos colegas etc. tudo ao mesmo tempo.
Não estava preparada para fazer uma introspecção, para olhar para seus medos, para desafiar seus pavores, para considerar a possibilidade das perdas e da própria morte.


Agora está impedida de sair de um espaço limitado; tem tempo de sobra, mas sofre com a privação do direito de ir e vir. Já não pode mais apertar a mão do vizinho nem abraçar a menina do empório nem mesmo seus familiares, pois até estão fugindo.
Essa pessoa percebe que, de verdade, só está consigo mesma e, ainda que confinada com seus familiares, está sendo obrigada a olhar para si própria e para suas coisas a fim de se reinventar.


Tem tempo de sobra para rever não somente sua carreira profissional, mas também sua trajetória de vida; reencontrar seus ideais de adolescente, perceber quais sonhos conseguiu realizar e também todas as frustrações que foram amealhadas ao longo de um tempo o qual percebe subjetivamente como curto, mas que agora, revendo racionalmente, julga longo demais.
 Os vizinhos, que sabiam da viagem, passam ao largo: olhares de medo, e sentimento de rejeição. Sente medo até de tocar no painel do elevador do prédio onde mora o qual, agora, tem um número limitado de ocupantes – três no máximo – com as recomendações “não conversar” e “evite espirrar”.


Também percebe que dava grande valor para certas coisas que, num átimo, passaram a quase não ter valor algum: “-Aquela bolsa de US$ 1,000.00 que tinha comprado no freeshop do aeroporto para mostrar para as amigas já não vale mais nada pois as amigas não podem sair de casa!” E o papel higiênico – que já está em falta no mercado – é o sonho de consumo muito mais importante que a bolsa neste momento...
Passa a sentir culpa de sair de casa, ainda que seja para comprar comida ou ir ao médico. Também sente solidão, ainda que esteja rodeada de pessoa pois está privada de trocar afeto até mesmo com seu namorado (a); tem medo de contaminar e de ser contaminada.
Sente-se insegura pois percebe que as autoridades estão dando orientações  opostas  e até contraditórias. E, para piorar ainda a confusão e o medo, renomados especialistas demonstram que pouco ou nada sabem e ficam debatendo publicamente condutas contraditórias com muita empáfia e pouco – ou nenhum – consenso.


Com poucos recursos para reconhecer seus medos, começa a dar respostas emocionalmente primitivas de forma impulsiva. Emerge sua agressividade e a labilidade emocional que se alternam; revolta-se, inflamada às vezes, secretamente noutras vezes, contra a situação, contra os familiares e – finalmente, contra si própria.


Começa a se punir por ter feito isso ou não ter permitido aquilo. A ideia do suicídio surge como alternativa para fugir disso tudo e “zerar de vez e começar tudo de novo na próxima encarnação; se é que ela existe”. Depois, vem a novamente e culpa e, de tanto se deparar com uma situação que percebe “sem saída”, ou vem a depressão ou vem a alienação psicológica como forma de “solucionar” o conflito.
Uma vez deprimido, o aparelho psíquico dessa pessoa passa a ser regido pelo negativismo e pela desesperança que começam a influenciar e enviesar o pensamento bem como alterar a sensopercepção. Passa a interpretar as notícias que lhe chegam de forma “negativa; por exemplo, : uma descoberta científica sobre a ação do vírus  é vista como  “uma demonstração da gravidade da doença” (sic) e não como “um novo foco [da Pesquisa Científica], que abrirá novas possibilidades de tratamento” (sic).


No corpo, a depressão e a ansiedade atuando juntas promovem sensação de fraqueza e exaustão mesmo após um esforço mínimo, acompanhada de dores musculares e incapacidade de relaxar. Podem ocorrer sesações físicas desagradáveis, tonturas e  dores de cabeça, o que leva a pessoa ao aumento das horas de sono e da ingestão de alimentos como forma de ocupar o tempo e aplacar os medos.
Neste momento, sem saber, nosso personagem está diante de uma bifurcação existendial: passar pelas adversidades e não esmorecer; querer readquirir a autoconfiança depois da pandemia e do pandemônio que se formou na sua vida ou permanecer deprimido, amargo, divorciado, viciado, recluso alienado ou “desligado” da vida pelos próximos anos. Em termos psicológicos precisa tomar uma decisão e sabe que não pode demorar muito para decidir.


Poderá ceder à pressão e passar representar o personagem do “sobrevivente” ou – como o banbuzal durante a tempestade tropical – se curvar para depois se reerguer.

Virando o Jogo

O termo psicológico para isso é uma palavra chique: “resiliência”.
“Pessoas resilientes possuem três características que as definem: aceitam com calma a realidade difícil que enfrentam; encontram sentido em coissas terríveis; e têm uma estraordinária capacidade de improvisar usando o que estiver à mão.” (cf.Coutu in GOLEMAN, 2019, grifos meus).
A boa notícia é que estamos falando de uma capacidade inata aos seres humanos, isto é, que poderá ser desenvolvida por qualquer pessoa, pois ja nasceu com ela. E isso costuma acontecer depois de passamos por alguma experiência negativa, inevitável e angustiante.
Para desenvolvermos e aperfeiçoarmos nossa capacidade de sermos resilientes precisaremos:

Encarar a realidade.
NÃO NEGUE a adversidade nem minimize a realidade que está sendo vivida. Analise a situação com sobreidade, mas sem julgamentos pessimistas ou culpas – em si ou nos outros – agui desnecessárias.

Buscar sentido.
Sem cair na tentação se colocar no papel de vítima, REFLITA sobre a angústia e o sofrimento a fim de criar um sentido inteligível para você e para aqueles que, porventura, estiverem junto com você.

Estabeleça pontes.
Estabelecento CONEXÕES entre sua “provação” os desejos futuros, você passará a entender o sofrimento como algo administrável – ou até mesmo necessário – para o atingimento dos seus anseios.

Seja criativo; improvise.
Procure sempre fazer o melhor que puder com o que tem à mão neste momento; procure imaginar possibilidades que os outros não vêem.

Mantenha senso de humor.
Mesmo que o humor seja mórbido e ele ajuda a ESTABELECER RELAÇÕES COM OUTRAS PESSOAS em situação semelhante à sua.

Como podemos notar, seja qual for a situação de confinamento pela qual praticamente toda a huamnidade passa durante a Pandemia COVID-19 todas as ações acima propostas poderão ser colocadas em prática.
Mesmo aqueles que estejam internados numa UTI, se estiverem lúcidos e com um mínimo de consciência preservada, poderão criar cenários mentais para analisar a situação e ajudare a equipe médica no tratamento adotando uma postura positiva se vincular sua capacidade afetiva à vida e não ao medo da morte.


Muitos dos pacientes que acompanho atualmente, praticando a aceitação da realidade, mas sem submição ao pessimismo ou ao vitimismo, essas pessoas estão descobrindo oportunidades e desenvolvendo habilidades que nunca haviam imaginado.


A propósito, uma lenda urbana:
Havia um homem muito otimista que vivia de forma muito feliz.
Certa vez tinha saído de casa para trabalhar e ladrões entraram na casa dele. Estavam roubando seus pertences quando  foram surpreendidos  pois, justamente naquele dia,  ele tinha voltado para casa mais cedo que o habitual. Covardemente o homem foi agredido e baleado.
Socorrido por vizinhos, deu entrada em estado crítico no  hospital. Estava lúcido e, por isso foi capaz de perceber na fisionomia da equipe de saúde que eles já estavam quase desistindo da sua recuperação. Foi quando a enfermeira lhe perguntou se ele tinha alergia a alguma coisa e ele prontamente respondeu “-Tenho sim. Tenho alergia a chumbo!” e emendou “Doutores, me façam um favor: me operem logo, sem medo; tirem logo essas balas daqui, senão vou morrer de alergia!”
O bom humor demonstrado naquela situação tão grave encorajou todos da equipe.  Diz a lenda que ele foi operado, sobreviveu e saiu sorrindo do hospital.”

Verdade ou mito, pergunto: na COVID-19 – nosso caso – por que não tentar fazer como ele?

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Keywords: COVID-19; Pandemia; Síndrome; Isolamento Social; Confinamento; Psicologia; Resiliência

Autor:
Marcos Rodrigues Maximino
- Psocólogo Clínico - CRP 06/34559-0
Especialista em Medicina Comportamental - UNIFESP
Diretor-presidente da Clínica Conceito-ação

Obras citadas::
GOLEMAN, D. (2019). Harward Business Review - Inteligênecia Emocional. Rio de Janeiro: GMT Editores Ltda.
GOVERNO DO ESTADO DE S. PAULO. (21 de 04 de 2020). Decreto 64.879 de 20/04/2020. Diário Oficial do Estado de São Paulo volume 130 nº 56.
GRUPO FORÇA COLABORATIVA -BRASIL. (13 de abril de 2020). Orientações sobre Diagnóstico, Tratamento e Isolamento de Pacientes com COVID-19. Fonte: http://www.acm.org.br/manual-de-diretrizes-para-diagnostico-e-tratamento-da-covid-19-do-ministerio-da-saude-disponivel-para-download/
WILSER-SMITH, A. (23 de março de 2020). Isolation, quarantine, social distancing and communitycontainment: pivotal role for old-style public healthmeasures in the novel coronavirus (2019-nCoV). Journal of Travel Medicine, pp. 1-4.

Para referir: MAXIMINO, MR. Como Lidar Bem com o Isolamento Social. disponível em www.marcosmaximino.psc.br/marcosmaximino_covid-4 acesso em dd/mm/aaaa.

Publicado em : 14 /04/2020; atualizado em: 16/04/2020.

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